segunda-feira, 24 de junho de 2013


Variações à experiência da escolha retardada

Extraido do livro O Tecido do Cosmo – O espaço, o tempo e a textura da realidade, de Brian Greene

A nova estranheza provém do fato de que o recebimento da informação de escolha ocorre muito depois de que o fóton tenha tido que “decidir”, no divisor de feixes, se atuará como onda e viajará pelos dois caminhos ou se atuará como partícula e viajará apenas por um deles. Quando o fóton passa pelo divisor de feixes, ele não pode “saber” se o novo detector estará ligado ou desligado – na verdade, o experimento pode ser realizado de maneira que o interruptor do detector só seja acionado depois que o fóton tenha passado pelo divisor de feixes. Para estar preparada para a possibilidade de que o detector esteja desligado, a onda quântica do fóton deve dividir-se e viajar por ambos os caminhos, de modo que um amálgama dos dois possa gerar o padrão de interferência observado. Mas, se acontecer que o novo detector esteja ligado – ainda que depois que o fóton já tenha deixado o divisor de feixes -, isso poderia causar uma crise de identidade para o fóton: ao passar pelo divisor de feixes, ele já se teria comprometido com o caráter ondulatório viajando pelos dois caminhos, mas agora, algum tempo depois de ter feito essa escolha, ele “percebe” que precisa passar a ser uma partícula, que viaja por um único caminho.

De algum modo, contudo, o fóton acerta sempre. Toda vez que o detector está ligado – mesmo que o ato de liga-lo ocorra bem depois de determinado fóton ter passado pelo divisor de feixes -, o fóton atua inteiramente como partícula. Ele será encontrado apenas em um dos caminhos para a tela (se colocássemos detectores de fótons mais abaixo, nas trajetórias, cada fóton emitido pelo laser seria detectado por um detector ou pelo outro, mas nunca pelos dois); os dados resultantes não mostram o padrão de interferência. Toda vez que o novo detector está desligado – mesmo que a decisão seja tomada depois que cada fóton tenha passado pelo divisor de feixes -, os fótons atuam inteiramente como ondas, produzindo o famoso padrão de interferência que indica que eles viajaram por ambas as trajetórias. É como se ajustassem o seu comportamento no passado de acordo com a escolha futura, segundo esteja o detector ligado ou desligado. É como se tivessem uma “premonição” da situação experimental que encontrariam mais adiante e já atuariam de acordo com ela. É como se uma história coerente e definida se tornasse manifesta apenas depois de que o futuro ao qual ela leva estivesse totalmente estabelecido. (...)

[Neste ponto, o autor mostra que a luz de um quasar, emitida e bilhões de anos, pode ser dividida de forma a, potencialmente, percorrer dois caminhos e chegar a Terra, no qual um detector pode identificar qual dos caminhos foi “adotado” pelo fóton: uma versão cósmica do experimento aqui descrito].

A mecânica quântica não nega que o passado tenha acontecido, e acontecido por completo. A tensão surge simplesmente porque o conceito quântico de passado é diferente do conceito de passado de acordo com a intuição clássica. A nossa criação clássica nos faz desejar dizer que determinado fóton fez isto ou aquilo. Mas no mundo quântico, no nosso mundo, esse raciocínio impõe ao fóton uma realidade demasiado restrita. Como vimos, na mecânica quântica a norma é uma realidade indeterminada, difusa, híbrida, que consiste em múltiplos ramos e que só se cristaliza em uma realidade mais familiar e definida quando se faz uma observação adequada. Não é que o fóton tenha decidido bilhões de anos atrás contornar a galáxia por um lado ou pelo outro. Durante esses bilhões de anos ele se manteve dentro da norma quântica – um híbrido de todas as possibilidades. (...)

Uma observação feita hoje, portanto, ajuda a completar a história que relatamos, de um processo que teve início ontem, ou no dia anterior, ou talvez há 1 bilhão de anos. Uma observação feita hoje pode delinear os detalhes que podemos e devemos incluir no nosso relato do passado.


  O Passado Apagado

É essencial ressaltar que, nesses experimentos, o passado não é de modo algum alterado pelas ações de hoje, e nenhuma modificação que façamos no experimento pode alcançar esse fim. Isso leva à seguinte pergunta: se não se pode modificar algo que já aconteceu, pode-se fazer a coisa mais próxima a isso – apagar o impacto desse fato sobre o presente? Em determinado grau, por vezes essa fantasia pode ser realizada. (...) Só quando um evento do passado parece impedir definitivamente a ocorrência de um evento futuro (assim como defesa do pênalti impede a vitória do time adversário), poderíamos pensar em que algo errado teria acontecido. O apagador quântico, originalmente concebido em 1982 por Marlan Scully e Kai Drühl, sugere esse tipo de estranheza na mecânica quântica.
(...)